"Sê paciente; espera / que a palavra amadureça / e se desprenda como um fruto / ao passar o vento que a mereça". Paciente e naturalmente, chegou o momento de colocar Eugénio de Andrade no centro da história que, todos os anos, atrai os amantes da literatura aos Jardins do Palácio de Cristal. "Por mais solar que seja o coração" é o verso que orienta a 11.ª edição da Feira do Livro do Porto. O encontro com a palavra do "poeta da luz" começa à página 23 do capítulo de agosto e leva os leitores até à página 8 do capítulo setembro. Pelo meio, há mais de uma centena de atividades culturais. "Para que nunca se extinga o lume da palavra".
Reparada, “porventura, uma injustiça”, o presidente da Câmara do Porto reforça que o evento deste ano será “uma oportunidade ímpar para conhecer e aprofundar a obra de Eugénio”, inclusive para “descobrirmos outras facetas do corpus poético, para lá do seu celebrado lirismo”, uma “poesia anti institucional”, uma “faceta mais politizada” e “interventiva”.
No momento da apresentação da programação da 11.ª edição da Feira do Livro do Porto, na manhã desta quarta-feira, Rui Moreira sublinhou como “o enraizamento portuense do poeta influenciou, fortemente, a sua vida e obra”, ao mesmo tempo que “o Porto ganhou uma outra aura, uma outra dimensão nos versos de Eugénio de Andrade”.
“Foi no Porto que, em grande medida, forjou a sua identidade, não só pessoal, mas também literária”, afirma o autarca, lembrando a crença de que a cidade "'herdou da aspereza do solo e do carão duro do rio uma solidez que leva às coisas da arte e do coração’”.
O presidente da Câmara referiu, ainda, a grande procura, testemunhada este ano, por parte de editores, distribuidores, livreiros e alfarrabistas, a qual atribuiu à “qualidade da programação” e à “forma como atrai públicos”, assim como ao facto de a Feira do Livro do Porto ser sentida como “uma oportunidade imperdível de promoção e negócio”. Ao todo, serão 130 os pavilhões a encher os jardins.
“A feira tem vindo a consolidar o seu estatuto, não só como um dos maiores certames livreiros, mas também como um dos principais festivais literários do país”, considera Rui Moreira, sublinhando a “programação estimulante, atrativa e que toca várias expressões artísticas”, definida, mais uma vez, pela equipa liderada por João Gesta.
O programador literário e coordenador do evento afirma a vontade de que a Feira “seja um espaço de luz e de cumplicidades, onde possamos celebrar a vida através da palavra e do gesto preciso e cristalino dos escritores e artistas convocados”.
“Construímos um festival literário fecundo, diversificado, multidisciplinar, inclusivo e contagiante”, inspirado no conselho do poeta que arranca este texto, garante. Uma “programação lucipotente”, para que “nunca se extinga o lume da palavra” e uma cidade “ao ritmo das emoções e do coração solar de muitos sonhadores especializados e espacializados”. Para João Gesta, Eugénio de Andrade está “indissoluvelmente ligado a este Porto solidário e coriáceo, onde a palavra ‘liberdade’ é menos secreta”.
“Os meses, os dias, um a um” é a nova obra da poesia de Eugénio
Igualmente presente na apresentação, nos Jardins do Palácio de Cristal, Paula Pinto Costa lembrou como a Faculdade de Letras da Universidade do Porto, da qual é diretora, “integra a Casa dos Livros, onde acolhe parte do acervo do poeta”, ali depositado pela Câmara do Porto e, atualmente, em tratamento técnico.
“Acredito que a Feira do Livro do Porto é mais uma oportunidade para sentirmos e explorarmos a obra do poeta”, sublinhou Paula Pinto Costa, adiantando que “tendo em consideração a relevância científica, cultural e social da obra de Eugénio de Andrade, e o que a mesma significa para a profícua cooperação institucional entre o Município do Porto e a Faculdade de Letras, vai ser, agora, editada mais uma obra do poeta”, uma coletânea de poemas que acolheu o título ‘Os meses, os dias, um a um’”.
“Para que nunca se extinga o lume da palavra”, a programação deste ano da Feira do Livro do Porto volta a confiar a palavra a diversos formatos e protagonistas, contados em 16 conversas, 21 concertos, sete apresentações de livros, quatro sessões de cinema, recitais de poesia e spoken word, stand up comedy e stand up poetry e mais de 50 atividades para bebés, infantojuvenis e para famílias.
Graças a Eugénio de Andrade, a Avenida das Tílias terá mais um exemplar atribuído aos nomes que fazem do Porto uma cidade literária. Ao ritmo do sentimento de que “o Porto é só a pequena praça onde há tantos anos aprendo metodicamente a ser árvore”, a cerimónia acontece na tarde de 24 de agosto e é apenas a primeira página de uma história onde cabe a conversa “Arco e Flecha: Temas de Eugénio Hoje”, sobre a intemporalidade da obra do poeta, ou a sessão “A Suprema Festa da Língua: Eugénio de Andrade e a Poesia como Tradição/Tradução”, que evoca as influências dos “mestres” do autor.
A primeira sessão do ciclo de cinema vai mostrar o documentário “Eugénio de Andrade, Coração Habitado” e a multidisciplinaridade do poeta vai poder ser testemunhada, ainda, na exposição “Post Scriptum sobre a Alegria”.
Cinco versos de Eugénio orientam cinco ciclos de conversas com as palavras de Dulce Maria Cardoso, Capicua, Gonçalo M. Tavares, Pilar Del Río e Carlos Tê e António Zambujo.
E porque é de livros que se trata, destaque para as apresentações da obra “A Urgência da Cidade – O Porto e 100 Anos de Fernando Távora”, assim como dos dois primeiros livros – sobre o Teatro Municipal e a própria Feira do Livro – da coleção que assinala uma reflexão sobre a última década do programa cultural portuense.
No auditório da Biblioteca Municipal Almeida Garrett, Nuno Artur Silva lança o primeiro olhar pela coleção “Erros Meus – Poesia Incompleta” e José Luís Peixoto desvenda o seu mais recente livro, “Um romance com pessoas.
Da palavra escrita à palavra cantada, vão passar pela Feira do Livro do Porto Valter Lobo, Frankie Chavez, Gisela João Milhanas, Tiago Nacarato e ainda o “Porta Jazz”.
Para crianças e famílias, o festival literário oferece “Oficinas no Terreiro” para criar “mestres” em escrita, encadernação ou pintura de azulejos. Com a ajuda da Anilupa, a iniciativa “Eugénio em Filme: Laboratório de Cinema e Animação” vai desafiar à realização de um filme e Gonçalo M. Tavares põe a imaginação dos mais jovens à prova numa oficina de escrita.
Todos os versos deste poema, onde “toda a poesia é luminosa, até a mais obscura”, podem ser consultados na página da Feira do Livro do Porto, onde também é possível fazer a inscrição nas atividades para os mais pequenos.
Texto: Porto.
Fotos: Miguel Nogueira